No time, no feeling

Ambos sabemos que o nosso tempo desapareceu a nossos olhos, nada resta a não ser nós, os nossos corpos vagabundos que vagueiam pelas estradas do destino desfiguradas, onde não existe uma saída, apenas uma entrada. Todas as portas se fecharam, as janelas tornaram-se inquebráveis e as chaves formaram pó que voou com a brisa que deixou um rasto de aroma nas nossas peles suadas de tanta raiva.
Concentro-me na dor que me percorre o corpo, me provoca a impressão e invoca o meu lado negro, aquele que se esconde no mais profundo do meu olhar, que ninguém vê e que apenas eu conheço verdadeiramente. Apenas este sentimento é real, é ele que me alimenta o espírito e me guia num mundo que desconheço e me torna apenas mais um sujeito sem rumo nem destino. Por momentos foste a minha luz que me guiou para o paraíso, no entanto, tornaste-te no pior dos demónios, o meu maior medo que me encaminhou para inferno, tornando a minha alma cativa de algo do qual ela sempre fugiu, tu.
Recordo o tempo em que foste a minha salvação, o bater do meu coração que ritmava desalmadamente sempre que tocavas no meu rosto e me provocavas as lágrimas sem razão. Contudo a razão sempre foste tu, o meu porquê, a justificação para minha existência.
A tua sombra contempla a minha escuridão, alimenta o negro dos meus olhos que cresce a cada segundo que o tempo consome como se matasse a sede do destino, és o meu inconsciente que age sempre quando eu não espero, roubando um pedaço de mim, tornando-me incompleta, querendo-te mais do que ontem, mais do que no dia em que foste embora sem promessa de voltar. Foste o meu sol, hoje és o fogo que arde em meu corpo, tornando-me cinza, impressão de algo que fui e que já não sou, o teu tudo que agora passou ao nada que ignoras e desprezas.
Ainda guardo na gaveta as tuas cartas carregadas de paixão ardente que consumiu toda a inocência da minha alma e arrebatou o meu coração com cada palavra marcante que cativou o meu ser e me tornou tua para a eternidade que um dia pensamos ter sido nossa mas que no entanto não passou de uma utopia que criamos para sermos as personagens principais de um romance que nunca passou de uma introdução remota sem fim pensado, muito menos escrito.
E eu estarei sempre aqui para ti, para quando relembrares o tudo que eu um dia fui a teu olhos, a alma que perdeste nos caminhos do futuro, o mundo que fechaste a sete chaves e do qual não te despediste. Eu andarei sempre pelos cantos do teu destino, esperando por algo que não sei se voltará, se voltarei a ver ou escutar. Apenas anseio pelo teu toque, pela vibração das tuas palavras que ecoam no meu ouvido e me fazem desejar-te ainda mais, querer-te mais do que te quero, tornar o impossível no mais provável, o de amar-te mais do que o que te amo.